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Kakhovka: Ucrânia vê ambiguidade na reação brasileira

sambafoot conversou com exclusividade com um dos mais próximos assessores do presidente Volodomyr Zelenskyy

O rompimento da barragem de Kakhovka fez com que os ucranianos travassem desde a confirmação do incidente uma intensa batalha diplomática para que não haja dúvidas sobre quem é o culpado. No vocabulário de Kiev, ganhou força o termo ecocídio, pra destacar a tragédia ambiental por trás da inundação de dezenas de cidades.

Por enquanto, nem os aliados mais próximos de Kiev, como os Estados Unidos e o Reino Unido, bateram o martelo na tese de que a culpa é da Rússia. Mas ambos reconhecem os muitos indícios que pesam contra Moscou.

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Além da tragédia humana e ambiental em curso, a área inundada é mais uma barreira para o avanço das tropas ucranianas rumo ao leste do rio Dnipro, área dominada pelos russos desde o início do ano passado.

Provocar um desastre dessa proporção pra culpar os russos traria poucos ganhos diplomáticos para Kiev, que já tem a seu favor a simpatia de quase toda a Europa, América do Norte e o apoio em peso da Otan, a aliança militar liderada pelos Estados Unidos. Arriscar um desgaste diplomático dessa proporção seria um passo pouco inteligente no momento em que o país se prepara para uma contraofensiva pra recuperar territórios invadidos.

Na entrevista que concedeu ao sambafoot, Igor Zhovkova, vice-chefe de gabinete (equivalente a vice-ministro da Casa Civil) do presidente Volodomyr Zelenskyy, usa ainda outro argumento. Quem controla aquela área, a represa e as pessoas que cuidam da represa são os russos.

Apesar de ainda haver dúvidas na comunidade internacional, Zhovkova, que também é diplomata, classificou como ambígua a reação do governo brasileiro. O Itamaraty publicou uma nota mais de 30 horas após o rompimento. O documento pode ser lido aqui.

"Espero que o seu país apoie os esforços da comunidade internacional pra trazer paz para a Ucrânia", diz Zhovkova   | Divulgação

A seguir, os principais trechos da entrevista, feita por videoconferência, na tarde desta 5ª feira.

Como o senhor avalia a reação do governo brasileiro?

Eu gostaria de agradecer ao governo brasileiro por reagir a esse terrível ataque do Estado agressor, a esse ato de ecocídio, a essa explosão da hidrelétrica, que estava sob poder dos russos desde fevereiro de 2022. Essa planta foi severamente minada e a Ucrânia mandou sinais pra comunidade internacional que isso poderia acontecer. Então, muito obrigado pela reação, pelo comprometimento em trabalhar com organizações internacionais nas consequências desse terrível desastre humanitário. É o terceiro dia após a explosão e nós ainda estamos evacuando pessoas dos territórios controlados pela Ucrânia. Mais de 2 mil pessoas já foram evacuadas pelas autoridades ucranianas. Mas entidades internacionais, como a Cruz Vermelha ou as instituições humanitárias das Nações Unidas ainda não apareceram. Nós estamos fazendo todo o trabalho sozinho e precisamos da ajuda dos nossos parceiros. A situação na parte que não controlamos na região de Kherson é desastrosa. Há mais de 20 mil pessoas deixadas com nada, pessoas que passaram a noite nos telhados esperando ajuda. Nada está sendo feito pelo Estado invasor ou por instituições internacionais. Então, obrigado pela prontidão do Brasil em ajudar.

Nessa declaração, o Brasil diz que está pronto pra trabalhar na mitigação das consequências do desastre. Não está claro pra nós se o Brasil já ofereceu algo para o governo da Ucrânia... houve alguma oferta?

Não ouvi nada do lado brasileiro nos oferecendo alguma coisa. A Ucrânia precisa de equipamentos pra essa operação. Mas se você me pergunta sobre a declaração, há uma certa ambiguidade. Se você controla o território por mais de um ano e você tem controle total sobre a usina e sobre o equipamento, você tem controle sobre as pessoas que trabalham na usina. Quem mais poderia fazer isso? Quem mais, se não eles que minaram a barragem? Todos ao redor ouviram o barulho da explosão. Nós gostaríamos que as autoridades de seu país fossem muito claras sobre quem culpar e como julgar essas pessoas. Isso não é apenas um ato terrorista. É um ecocídio. Só teremos uma noção da consequência ambiental desse desastre daqui a alguns dias. Isso afetou nossas terras, onde plantamos grãos que são exportados para países pobres do mundo todo. Então, pedimos pra que o seu governo preste mais atenção nesse ponto, do desastre ambiental, que nesse minuto está acontecendo no território do meu país. Meu presidente apresentou ao presidente Lula a nossa proposta de paz e um dos itens é o item 8, que é sobre a agressão ambiental. Infelizmente, o que estávamos prevendo agora se tornou verdade. E tem ainda o perigo da Usina Nuclear. A água do reservatório era usada também pra esfriar os reatores da usina nuclear (Zaporíjia). Agora, temos menos possibilidade de fazer isso. Felizmente, meu presidente conversou com o secretário-geral da IAEA (sigla em inglês pra Agência Internacional de Energia Atômica), Rafael Grossi, que está vindo a Kiev na próxima semana. O que vemos é o inimaginável acontecendo. Isso são práticas de um Estado terrorista. Então, certamente o governo brasileiro deveria ajudar a Ucrânia a lidar com esse ecocídio feito pela Rússia.

Os presidentes conversaram apenas uma vez, por videoconferência. Poderiam ter conversado no Japão, mas não aconteceu. O governo brasileiro diz que o presidente Zelensky não apareceu no encontro que estava marcado. Isso é verdade?

Isso é especulação. Não entendo porque isso está sendo dito. Meu presidente esteve no encontro por menos de 24 horas. Houve muitos encontros, muita diplomacia, agenda apertada. Meu presidente estava pronto pra encontrar o presidente Lula, assim como, espero, o presidente Lula estava pronto pra encontrar meu presidente. Infelizmente, eu entendo que as agendas não permitiram. Mas o presidente Lula estava na sessão quando o meu presidente estava falando sobre a nossa fórmula de paz e os esforços da Ucrânia pra escala de segurança alimentar. Meu presidente convidou o presidente Lula pra vir a Kiev e ver o que está acontecendo na Ucrânia. Acho que o diálogo deve continuar.

Ele disse, aliás, que só iria se sentisse que há espaço pra negociar a paz. E a posição do governo brasileiro é que não há esse clima agora. O Brasil se coloca como neutro. Como está o humor do governo ucraniano com o governo brasileiro nesse momento?

Você pergunta para uma pessoa que está vivendo dia e noite sob constante bombardeios, de mísseis balísticos ou mísseis de cruzeiro, ou os dois, ou ainda de drones. Então, você me pergunta como eu me sinto sobre neutralidade, não é hora de neutralidade. Essa é uma guerra de agressão da Rússia contra o meu país. Há espaço pra que todos os países civilizados ajudem a responsabilizar o agressor pelo que acontece na Ucrânia e trazer paz para o meu país.

O senhor vê a posição do Brasil como uma posição pró-Rússia?

Eu não estou dizendo pró-Rússia ou pró-nenhum país. Espero que o seu país apoie os esforços da comunidade internacional pra trazer paz para a Ucrânia.

E uma última pergunta, podemos considerar que a contraofensiva ucraniana já começou?

Não vou comentar isso. Peço desculpas.

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